Tuesday, May 09, 2017

SERMÃO DA SEXAGÉSIMA







“Quando Cristo mandou pregar os Apóstolos pelo Mundo, disse-lhes desta maneira: Euntes in mundum universum, praedicate omni creaturae: «Ide, e pregai a toda a criatura». Como assim, Senhor?! Os animais não são criaturas?! As árvores não são criaturas?! As pedras não são criaturas?! Pois hão os Apóstolos de pregar às pedras?! Hão-de pregar aos troncos?! Hão-de pregar aos animais?! Sim, diz S. Gregório, depois de Santo Agostinho. Porque como os Apóstolos iam pregar a todas as nações do Mundo, muitas delas bárbaras e incultas, haviam de achar os homens degenerados em todas as espécies de criaturas: haviam de achar homens homens, haviam de achar homens brutos, haviam de achar homens troncos, haviam de achar homens pedras. E quando os pregadores evangélicos vão pregar ar a toda a criatura, que se armem contra eles todas as criaturas?! Grande desgraça! ” (p. 3)
 “Oh que grandes esperanças me dá esta sementeira! Oh que grande exemplo me dá este semeador! Dá-me grandes esperanças a sementeira porque, ainda que se perderam os primeiros trabalhos, lograr-se- ão os últimos. Dá-me grande exemplo o semeador, porque, depois de perder a primeira, a segunda e a terceira parte do trigo, aproveitou a quarta e última, e colheu dela muito fruto. Já que se perderam as três partes da vida, já que uma parte da idade a levaram os espinhos, já que outra parte a levaram es pedras, já que outra parte a levaram os caminhos, e tantos caminhos, esta quarta e última parte, este último quartel da vida, porque se perderá também? Porque não dará fruto? Porque não terão também os anos o que tem o ano? O ano tem tempo para as flores e tempo para os frutos. Porque não terá também o seu Outono a vida?”  (p. 4)
“O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento.” (p. 6)
Os ouvintes ou são maus ou são bons; se são bons, faz neles fruto a palavra de Deus; se
são maus, ainda que não faça neles fruto, faz efeito. (p. 7)

                                   SERMÃO DE SANTO ANTONIO AOS PEIXES
PADRE ANTÔNIO VIEIRA




“Enfim, que havemos de pregar hoje aos peixes? Nunca pior auditório. Ao menos têm os peixes duas boas qualidades de ouvintes: ouvem e não falam. Uma só cousa pudera desconsolar ao pregador, que é serem gente os peixes que se não há-de converter. Mas esta dor é tão ordinária, que já pelo costume quase se não sente. Por esta causa mão falarei hoje em Céu nem Inferno; e assim será menos triste este sermão, do que os meus parecem aos homens, pelo encaminhar sempre à lembrança destes dois fins. ” (p.4)

“Vindo, pois, irmãos, às vossas virtudes, que são as que só podem dar o verdadeiro louvor, a primeira que se me oferece aos olhos hoje, é aquela obediência com que, chamados, acudistes todos pela honra de vosso Criador e Senhor, e aquela ordem, quietação e atenção com que ouvistes a palavra de Deus da boca de seu servo António. Oh grande louvor verdadeiramente para os peixes e grande afronta e confusão para os homens! Os homens perseguindo a António, querendo-o lançar da terra e ainda do Mundo, se pudessem, porque lhes repreendia seus vícios, porque lhes não queria falar à vontade e condescender com seus erros, e no mesmo tempo os peixes em inumerável concurso acudindo à sua voz, atentos e suspensos às suas palavras, escutando com silêncio e com sinais de admiração e assenso (como se tiveram entendimento) o que não entendiam. Quem olhasse neste passo para o mar e para a terra, e visse na terra os homens tão furiosos e obstinados e no mar os peixes tão quietos e tão devotos, que havia de dizer? Poderia cuidar que os peixes irracionais se tinham convertido em homens, e os homens não em peixes, mas em feras. Aos homens deu Deus uso de razão, e não aos peixes; mas neste caso os homens tinham a razão sem o uso, e os peixes o uso sem a razão. ” (p.5)

“Este é, peixes, em comum o natural que em todos vós louvo, e a felicidade de que vos dou o parabém, não sem inveja. Descendo ao particular, infinita matéria fora se houvera de discorrer pelas virtudes de que o Autor da natureza a dotou e fez admirável em cada um de vós.” (p.8)


                                                           QUESTÃO

O Sermão da Sexagésima foi pregado na Capela Real (Lisboa), provavelmente em 31 de Janeiro de 1655,  para discutir a arte de fazer sermões e os efeitos da multiplicação da palavra divina, enfatizando que “A semente é a palavra de Deus”, e que "Se a palavra de Deus é tão eficaz e tão poderosa, como vemos tão pouco fruto da palavra de Deus?".
       Opere uma comparação entre o Sermão da Sexagésima e o Sermão de Santo Antônio aos Peixes, 
pregado em S. Luís do Maranhão, a 13 de junho (dia de Santo António no calendário litúrgico) de 1654 e desenvolva um olhar crítico sobre a relação que o Padre Vieira propõe comparando os homens e os peixes.


Referências:
     Moiséis, Massaud. A Língua Portuguesa através dos textos,São Paulo, Editora Cultrix, 1ª Edição - 1968, pág.141
 http://www.culturatura.com.br/obras/Serm%C3%A3o%20da%20Sexag%C3%A9sima.pdf 
http://www.biblio.com.br/defaultz.asp?link=http://www.biblio.com.br/conteudo/padreantoniovieira/stoantonio.htm
Imagem: (https://grijo.wordpress.com/tag/sermao-aos-peixes/)

Wednesday, November 16, 2016

O caderno literário Literando é um projeto da disciplina de Teoria da Literatura  do curso de Letras da Univille, ministrada pela professora Taiza Mara Rauen Moraes. Esta é a 3° edição do caderno.

























Monday, November 30, 2015

Atividade de Teoria da Literatura II

Fazer leitura comparativa dos aspectos intertextuais atualizados nas narrativas curtas - BICICLETAS, de Péricles Prade (In Correspondências- narrativas mínimas. Porto Alegre: Movimento, 2009) e O ciclista, de Dalton Trevisan (In O beijo na nuca. São Paulo: Record. 2014).

O ciclista
Dalton Trevisan

Curvado no guidão lá vai ele numa chispa. Na esquina dá com o sinal vermelho e não se perturba – levanta vôo bem na cara do guarda crucificado. No labirinto urbano persegue a morte como trim-trim da campainha: entrega sem derreter sorvete a domicílio.
É sua lâmpada de Aladino a bicicleta e, ao sentar-se no selim, liberta o gênio acorrentado ao pedal. Indefeso homem, frágil máquina, arremete impávido colosso, desvia de fininho o poste e o caminhão; o ciclista por muito favor derrubou o boné.
Atropela gentilmente e, vespa furiosa que morde, ei-lo defunto ao perder o ferrão. Guerreiros inimigos trituram com chio de pneus o seu diáfono esqueleto. Se não se estrebucha ali mesmo, bate o pó da roupa e – uma perna mais curta – foge por entre nuvens, a bicicleta no ombro.
Opõe o peito magro ao pára-choque do ônibus. Salta a poça d´água no asfalto. Nem só corpo, touro e toureiro, golpeia ferido o ar nos cornos do guidão.
Ao fim do dia, José guarda no canto da casa o pássaro de viagem. Enfrenta o sono trim-trim a pé e, na primeira esquina, avança pelo céu na contramão, trim-trim.

Tuesday, November 10, 2015

As metamorfoses de Nuno Ramos


"Nuno Ramos – o grande artista plástico brasileiro - lançou em 2001 seu segundo livro de poesia, abstrusamente classificado na ficha catalográfica como “ficção brasileira”. Bernardo Carvalho, em sua coluna no jornal Folha de São Paulo [1], tapa os olhos para enxergar contos na prosa poética desse livro; não sei o que diria ao analisar os Pequenos Poemas em Prosa de Baudelaire... Chega de apropriações indébitas de gênero: O Pão do corvo é um livro de poesia como o anterior Cujo, também escrito em prosa e publicado pela Editora 34, em 1993.Não sei a quem atribuir a apropriação, que certamente não fará diferença alguma no destino da obra no mercado; contudo, fato é que, na Folha de São Paulo, Nuno Ramos publicou anteriormente um dos textos desse livro, em prosa como todos os outros, como poema [2]. Ademais, não fosse poesia, o livro seria uma obra filosófica, e não ficção."

Trecho extraído: Rodapé, revista de crítica de literatura brasileira contemporânea, São Paulo: Nankin Editorial, n. 3, nov. 2004, p. 137-144






Nunos Ramos expôs, no dia 25 de setembro de 2010, a instalação Bandeira Branca, na 29ª Bienal de São Paulo, que despertou uma série de polêmicas. Segundo a crítica, nenhum trabalho causou tanto burburinho quanto ‘Bandeira Branca’, do paulistano Nuno Ramos, posicionada no vão central do edifício projetado por Oscar Niemeyer. Ousada, a obra foi exibida pela primeira vez em 2008, no Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília, e traz três esculturas. No alto de uma delas, caixas de som tocam músicas como 'Carcará'. Dentro dessa área, cercada por uma rede, foram soltos três urubus-de-cabeça-amarela vivos - o motivo da confusão.

Proposta:
  • Navegue na web e, numa leitura intertextual, descubra as metamorfoses de Nuno Ramos e poste suas impressões leitoras.


Wednesday, August 19, 2015

Literando: Edição Lima Barreto

O caderno literário Literando é um projeto da disciplina de Teoria da Literatura II do curso de Letras da Univille, ministrada pela professora Taiza Mara Rauen Moraes. Esta edição conta com ensaios sobre as obras e vida de Lima Barreto.






















Thursday, May 07, 2015

O DISCURSO COMO INSTRUMENTO DE PROPAGAÇÃO DA FÉ

EXERCÍCIO REFLEXIVO – SERMÃO DA SEXAGÉSIMA – PADRE ANTÔNIO VIEIRA

1. O Barroco foi um movimento que apresentou especificidades complexas e de difícil compreensão, como a oposição do mundo material com o espiritual. Um exemplo é a representação da pintura Vênus e Adonis, de Rubens (1577 - 1640):




Como esses contrapontos aparecem no Sermão da Sexagésima, de Padre Antônio Vieira, sabendo que o texto apresenta elementos clássicos e barrocos?

2. “A unidade barroca não é a mesma que a clássica que nos induz a ver em detalhe. A unidade barroca convida a ver como um todo. Teríamos no caso uma “unidade absoluta em que as partes perderam seus direitos individuais” pois que o barroco abole a independência uniforme das partes em favor de um motivo total mais uniforme.” (VIEIRA, Antônio. Sermões. Prefácio de Jamil Almansur Haddad. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1954)

A partir do parágrafo acima, discorra sobre a limitação de assunto nos sermões de Vieira.